ANTOLOGIA DE PENSADORES 1970-I
70-06-14-ls- segunda-feira, 9 de Dezembro de 2002-scan
14/Junho/1970 - Curioso fenómeno de transfert é o que se verifica nas atribuições específicas hoje preconizadas, em face das possibilidades abertas pela tecnologia ao fabrico do que antes se entendia criado.
Quer dizer: enquanto a música se abeira, sistematicamente, não só do cálculo matemático mas dos ordenadores - que tomam o lugar executivo do compositor, ficando este embora com o encargo de pensar a obra, de a ditar -, enquanto os poetas entregam também aos computadores o encargo de fabricar as endechas que eles já desistiram de criar, os cientistas e filósofos da ciência, talvez desiludidos com o que estarrece e fascina os não técnicos (sempre somos um pouco pacóvios e provincianos em relação às especialidades dos outros...) aplicam-se aos campos da imaginação criadora - tradicionalmente feudo privado de escritores, artistas, poetas e demais "reveurs".
É uma espécie de intercâmbio, segundo a lei das compensações: os artistas vão sujeitar-se à disciplina positiva das matemáticas; o filósofo, o técnico, o economista procuram exorbitar dessa disciplina e reganhar o imaginário, quer dizer, a experiência-vivência não permitida pelo uso e abuso da máquina. A máquina faz tudo por nós...
Alguns dos artigos aqui inseridos são viva prova disso: homens saídos dos áridos campos da Economia, da Política, da Sociologia, da Ecologia, afirmam-se entusiastas de uma Prospectiva que é, nem mais nem menos, do que a imaginação aplicada em campos de onde tradicionalmente se considerava avessa e arredia.
Josué de Castro ilustra o que dizemos.
Prodigioso génio da síntese e criador vertiginoso do essencial, do que importa, do que marca, até pela clareza expositiva do seu estilo ele é bem um artista, um criador, um agente activo da cultura.
Com ele, o cientista deixa de ser um técnico mas sem abandonar a mais estrita tecnicidade para ser o que faz o permanente intercâmbio entre as especialidades parcelares e as generalidades globais.
Edgar Morin é outro exemplo do investigador "possesso" de imaginação e de poder criador. Mesmo como filósofo (e porque vive a dialéctica em ver de unicamente a teorizar) Edgar Morin cria, quer dizer, nele são indissociáveis Imaginação e Acção.
A ele se aplica, com propriedade, o feliz neologismo de que Alfred Willener fez centro e título da sua última Obra: Image-Action de la Société ou la Politisation Culturelle (Ed. Seuil). Image+Action = Imaginaction: aqui se contém todo um programa.
A imaginação no poder, que André Malraux, na entrevista à Der Spiegel aqui reproduzida, considera uma utopia, é de facto uma utopia: simplesmente para a nova geração de pensadores, acção, poesia, dialéctica e pensamento parecem estar a viver um processo de perfeita simbiose. Já ia sendo tempo de vermos a dialéctica passar dos livros ao único lugar onde existe: a vida, seja ela, a das coisas seja a dos símbolos.
A música e a poesia por computadores apenas transferem para outros campos os problemas da hiper-análise que antes pareciam exclusivo das ciências e técnicas. Apenas adiam os problemas.
Tempo virá em que o músico e o poeta "como técnicos" sintam a mesma necessidade de religação à unidade ou totalidade vivencial, a mesma urgência de reidentidade que toca o homem alienado (desidentificado consigo) necessariamente sente.
Talvez o reencontro seja então decisivo: nessa altura já todos - artistas e investigadores - atravessaram a trágica experiência do parcelamento, da desintegração, da hiper-reificação. E então, também aí a dialéctica em acção e a acção dialéctica será um processo irreversível.
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IMAGE+ACTION = IMAGINACTION
OU A FILOSOFIA CONTRA A TECNICIDADE
OU A FILOSOFIA CONTRA A TECNICIDADE
14/Junho/1970 - Curioso fenómeno de transfert é o que se verifica nas atribuições específicas hoje preconizadas, em face das possibilidades abertas pela tecnologia ao fabrico do que antes se entendia criado.
Quer dizer: enquanto a música se abeira, sistematicamente, não só do cálculo matemático mas dos ordenadores - que tomam o lugar executivo do compositor, ficando este embora com o encargo de pensar a obra, de a ditar -, enquanto os poetas entregam também aos computadores o encargo de fabricar as endechas que eles já desistiram de criar, os cientistas e filósofos da ciência, talvez desiludidos com o que estarrece e fascina os não técnicos (sempre somos um pouco pacóvios e provincianos em relação às especialidades dos outros...) aplicam-se aos campos da imaginação criadora - tradicionalmente feudo privado de escritores, artistas, poetas e demais "reveurs".
É uma espécie de intercâmbio, segundo a lei das compensações: os artistas vão sujeitar-se à disciplina positiva das matemáticas; o filósofo, o técnico, o economista procuram exorbitar dessa disciplina e reganhar o imaginário, quer dizer, a experiência-vivência não permitida pelo uso e abuso da máquina. A máquina faz tudo por nós...
Alguns dos artigos aqui inseridos são viva prova disso: homens saídos dos áridos campos da Economia, da Política, da Sociologia, da Ecologia, afirmam-se entusiastas de uma Prospectiva que é, nem mais nem menos, do que a imaginação aplicada em campos de onde tradicionalmente se considerava avessa e arredia.
Josué de Castro ilustra o que dizemos.
Prodigioso génio da síntese e criador vertiginoso do essencial, do que importa, do que marca, até pela clareza expositiva do seu estilo ele é bem um artista, um criador, um agente activo da cultura.
Com ele, o cientista deixa de ser um técnico mas sem abandonar a mais estrita tecnicidade para ser o que faz o permanente intercâmbio entre as especialidades parcelares e as generalidades globais.
Edgar Morin é outro exemplo do investigador "possesso" de imaginação e de poder criador. Mesmo como filósofo (e porque vive a dialéctica em ver de unicamente a teorizar) Edgar Morin cria, quer dizer, nele são indissociáveis Imaginação e Acção.
A ele se aplica, com propriedade, o feliz neologismo de que Alfred Willener fez centro e título da sua última Obra: Image-Action de la Société ou la Politisation Culturelle (Ed. Seuil). Image+Action = Imaginaction: aqui se contém todo um programa.
A imaginação no poder, que André Malraux, na entrevista à Der Spiegel aqui reproduzida, considera uma utopia, é de facto uma utopia: simplesmente para a nova geração de pensadores, acção, poesia, dialéctica e pensamento parecem estar a viver um processo de perfeita simbiose. Já ia sendo tempo de vermos a dialéctica passar dos livros ao único lugar onde existe: a vida, seja ela, a das coisas seja a dos símbolos.
A música e a poesia por computadores apenas transferem para outros campos os problemas da hiper-análise que antes pareciam exclusivo das ciências e técnicas. Apenas adiam os problemas.
Tempo virá em que o músico e o poeta "como técnicos" sintam a mesma necessidade de religação à unidade ou totalidade vivencial, a mesma urgência de reidentidade que toca o homem alienado (desidentificado consigo) necessariamente sente.
Talvez o reencontro seja então decisivo: nessa altura já todos - artistas e investigadores - atravessaram a trágica experiência do parcelamento, da desintegração, da hiper-reificação. E então, também aí a dialéctica em acção e a acção dialéctica será um processo irreversível.
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