J. SANTOS 92
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8-2-1992
FIGURAS MARCANTES - UM EDUCADOR DE GENTE
Súmula de um pensamento e de uma vida devotada à educação infantil, o livro do dr. João Santos que a editora Horizonte publicou(*), na sua colecção de pedagogia, é grande não só pelo número de páginas, distribuídas por dois volumes, mas pelo retrato que faz deste médico, educador e psicanalista.
Ensaios com muito de autobiografia intelectual, estes textos dispersos dão-nos, no entanto, uma imagem límpida e coerente dessa personalidade carismática que foi mestre João Santos. Em certo sentido, e guardadas as devidas diferenças, é um livro tão importante na história do pensamento pedagógico português como o «Diário» de Sebastião da Gama.
Muito mais técnico do que o professor e poeta da Arrábida, o pensamento de João Santos traduz uma filosofia humanista que algumas correntes modernistas pareciam ter afastado momentaneamente destas áreas, como se Claparède ou Pestalozzi ou mesmo Maria Montessori estivessem mortos e ultrapassados.
João Santos, apesar da sua formação científica em instituições de cariz tecnocrático, e dos aliciantes cargos que ocupou em tudo quanto era «establishment», nunca sossobrou nessa tentação: e ao ver o seu invejável curriculum, onde não houve nenhum cargo honroso e nenhuma autoridade académica que lhe não tivesse sido conferida, causa espanto como é que ele pode continuar, tal e qual como uma criança na aurora da vida, a ver o mundo com uma transparência cristalina e a escrever os axiomas essenciais da existência, sem jamais perder o pé da comunicação e do coração como meio de telecomunicação audio-visual.
Quem quiser fazer uma cura de humildade -- seja ou não professor -- é favor ler estas páginas e guardá-las como livro de (todas as) horas. Para lá de tudo o mais que se torna admirável nesta personalidade da nossa ciência pedagógica que foi João Santos, prematuramente falecido em Abril de 1987, teremos que admirar a sua capacidade de resistir à envolvente tecnocracia que contaminou as modernas ciências humanas, permanecendo o eterno «poeta» que viaja entre as pessoas como seu fiel companheiro de viagem.
Depois de António Sérgio e do seu humanismo racionalista, há muito que não nos víamos constrangidos a uma admiração tão incondicional como por estes textos fabulosamente «revolucionários» de João Santos. Eles contrariam tudo o que é hoje dominante, as histerias consumistas, as ilusões pan-europeias, os horizontes de um futuro bloqueado, a falta de sentido das corridas e metas sem sentido, os vómitos recobertos de celofane que são os poderosos «media» que nos devoram o tempo, o feitio e a paciência.
O médico João Santos não é apenas um educador de crianças: é um «mestre de pensamento» para todos nós os que ainda tentam, in extremis, resistir na contra-corrente à corrente hegemónica e dominadora de todas as tecnocracias, à esquerda, à direita e ao centro. Um educador de gente, no sentido literal e mais lato.
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(*) «Ensaios sobre Educação» -- Dois volumes -- João Santos -- Livros Horizonte -- Colecção «Biblioteca do educador»
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8-2-1992
FIGURAS MARCANTES - UM EDUCADOR DE GENTE
Súmula de um pensamento e de uma vida devotada à educação infantil, o livro do dr. João Santos que a editora Horizonte publicou(*), na sua colecção de pedagogia, é grande não só pelo número de páginas, distribuídas por dois volumes, mas pelo retrato que faz deste médico, educador e psicanalista.
Ensaios com muito de autobiografia intelectual, estes textos dispersos dão-nos, no entanto, uma imagem límpida e coerente dessa personalidade carismática que foi mestre João Santos. Em certo sentido, e guardadas as devidas diferenças, é um livro tão importante na história do pensamento pedagógico português como o «Diário» de Sebastião da Gama.
Muito mais técnico do que o professor e poeta da Arrábida, o pensamento de João Santos traduz uma filosofia humanista que algumas correntes modernistas pareciam ter afastado momentaneamente destas áreas, como se Claparède ou Pestalozzi ou mesmo Maria Montessori estivessem mortos e ultrapassados.
João Santos, apesar da sua formação científica em instituições de cariz tecnocrático, e dos aliciantes cargos que ocupou em tudo quanto era «establishment», nunca sossobrou nessa tentação: e ao ver o seu invejável curriculum, onde não houve nenhum cargo honroso e nenhuma autoridade académica que lhe não tivesse sido conferida, causa espanto como é que ele pode continuar, tal e qual como uma criança na aurora da vida, a ver o mundo com uma transparência cristalina e a escrever os axiomas essenciais da existência, sem jamais perder o pé da comunicação e do coração como meio de telecomunicação audio-visual.
Quem quiser fazer uma cura de humildade -- seja ou não professor -- é favor ler estas páginas e guardá-las como livro de (todas as) horas. Para lá de tudo o mais que se torna admirável nesta personalidade da nossa ciência pedagógica que foi João Santos, prematuramente falecido em Abril de 1987, teremos que admirar a sua capacidade de resistir à envolvente tecnocracia que contaminou as modernas ciências humanas, permanecendo o eterno «poeta» que viaja entre as pessoas como seu fiel companheiro de viagem.
Depois de António Sérgio e do seu humanismo racionalista, há muito que não nos víamos constrangidos a uma admiração tão incondicional como por estes textos fabulosamente «revolucionários» de João Santos. Eles contrariam tudo o que é hoje dominante, as histerias consumistas, as ilusões pan-europeias, os horizontes de um futuro bloqueado, a falta de sentido das corridas e metas sem sentido, os vómitos recobertos de celofane que são os poderosos «media» que nos devoram o tempo, o feitio e a paciência.
O médico João Santos não é apenas um educador de crianças: é um «mestre de pensamento» para todos nós os que ainda tentam, in extremis, resistir na contra-corrente à corrente hegemónica e dominadora de todas as tecnocracias, à esquerda, à direita e ao centro. Um educador de gente, no sentido literal e mais lato.
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(*) «Ensaios sobre Educação» -- Dois volumes -- João Santos -- Livros Horizonte -- Colecção «Biblioteca do educador»
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