A. BRETON 92
92-02-03–ls-ss = surrealismo e surrealistas - breton [solta - suplemento «Largo» - 2388 caracteres]
3-2-1992
Relendo «O Amor Louco» de André Breton, na tradução de Luísa Neto Jorge, e o «O Acaso e a Necessidade», de Jacques Monod, algumas ideias convém reter para futuras investigações no desconhecido a que se costuma chamar futuro.
«Para a maioria dos espíritos literários, o fantástico define-se como uma violação das leis naturais, uma aparição do impossível» - diz Louis Pauwels, que logo a seguir comenta e rejeita aquela definição tradicional: «Junto ao insólito e ao curioso, o fantástico seria um aspecto mais do pitoresco. Ora investigar o pitoresco nos parece uma actividade ociosa e, resumindo, uma ocupação burguesa. Segundo o nosso parecer, o fantástico não é jamais uma violação, mas uma manifestação das leis naturais. Surge do mesmo contacto com a realidade, com a realidade observada directamente e não filtrada através dos nossos preconceitos e prejuízos, velhos e novos.»
Temos então que, ao contrário do assente e aceite, o fantástico não é uma violação das leis mas um alargamento dessas leis naturais até onde os preconceitos e prejuízos não deixavam ir a imaginação (a razão imaginadora).
Não parece abusivo, pois, considerar que Alfred Jarry com a sua Patafísica, Breton com o surrealismo, Pauwels com o realismo fantástico, Jacques Monod com as suas heresias de biólogo heterodoxo, estão prolongando e não negando a ciência.
Não é mera questão de palavras chamar «ciência» à ciência A, ou chamar ciência a tudo o que, de A a Z, merece tal nome. Não é indiferente e a diferença é importante. Porque está em jogo o reconhecimento «científico» de coisas como as «leis da excepção» (Alfred Jarry), a «lógica do contraditório» (Stephan Lupasco) e a dialéctica da individualidadee criadora (anarco-utopismo). No fundo, trata-se de (re)descobrir a imaginação e suas leis. Ora o que uma concepção tradicional recusa é que haja leis para a imaginação e que a liberdade possa ter a sua gramática.
Tal como Breton ensina em «O Amor Louco», pode cultivar-se o acaso e pode trabalhar-se para não sermos cegas vítimas do finalismo fatalista e determinista. Pode ir-se ao encontro do livre arbítrio.
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(*) «O Amor Louco», André Breton, Trad. Luisa Neto Jorge, Ed. estampa, Lisboa, 1971
«O Acaso e a Necessidade», Jacques Monod, Col«Estudos e Documentos», Publicações Europa-América
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3-2-1992
RELEITURAS DO ACASO
AS LEIS DO IMAGINÁRIO
Relendo «O Amor Louco» de André Breton, na tradução de Luísa Neto Jorge, e o «O Acaso e a Necessidade», de Jacques Monod, algumas ideias convém reter para futuras investigações no desconhecido a que se costuma chamar futuro.
«Para a maioria dos espíritos literários, o fantástico define-se como uma violação das leis naturais, uma aparição do impossível» - diz Louis Pauwels, que logo a seguir comenta e rejeita aquela definição tradicional: «Junto ao insólito e ao curioso, o fantástico seria um aspecto mais do pitoresco. Ora investigar o pitoresco nos parece uma actividade ociosa e, resumindo, uma ocupação burguesa. Segundo o nosso parecer, o fantástico não é jamais uma violação, mas uma manifestação das leis naturais. Surge do mesmo contacto com a realidade, com a realidade observada directamente e não filtrada através dos nossos preconceitos e prejuízos, velhos e novos.»
Temos então que, ao contrário do assente e aceite, o fantástico não é uma violação das leis mas um alargamento dessas leis naturais até onde os preconceitos e prejuízos não deixavam ir a imaginação (a razão imaginadora).
Não parece abusivo, pois, considerar que Alfred Jarry com a sua Patafísica, Breton com o surrealismo, Pauwels com o realismo fantástico, Jacques Monod com as suas heresias de biólogo heterodoxo, estão prolongando e não negando a ciência.
Não é mera questão de palavras chamar «ciência» à ciência A, ou chamar ciência a tudo o que, de A a Z, merece tal nome. Não é indiferente e a diferença é importante. Porque está em jogo o reconhecimento «científico» de coisas como as «leis da excepção» (Alfred Jarry), a «lógica do contraditório» (Stephan Lupasco) e a dialéctica da individualidadee criadora (anarco-utopismo). No fundo, trata-se de (re)descobrir a imaginação e suas leis. Ora o que uma concepção tradicional recusa é que haja leis para a imaginação e que a liberdade possa ter a sua gramática.
Tal como Breton ensina em «O Amor Louco», pode cultivar-se o acaso e pode trabalhar-se para não sermos cegas vítimas do finalismo fatalista e determinista. Pode ir-se ao encontro do livre arbítrio.
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(*) «O Amor Louco», André Breton, Trad. Luisa Neto Jorge, Ed. estampa, Lisboa, 1971
«O Acaso e a Necessidade», Jacques Monod, Col«Estudos e Documentos», Publicações Europa-América
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