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Wednesday, February 08, 2006

LAFARGUE, NIZAN E FRANZ FANON em 1992

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A PRODIGIOSA DÉCADA DE 60

[9-2-1992]

A reedição de Lafargue ou Nizan poderá significar, antes, que nos estamos de novo agarrando àquelas bóias seguras que nos permitam não ir totalmente ao fundo da presente e peripatética abjecção. Do presente caos. Da presente e omnipresente confusão.
Quer «O Direito à Preguiça», de Paul Lafargue, quer o «Aden-Arabie» de Paul Nizan, talvez nos ajudem e não cair de todo e sem remédio no fosso dos sucessos contemporâneos em matéria de negócio ideológico e editorial.
Paul Lafargue e Paul Nizan de novo nos escaparates das novidades editoriais, ajudam-nos a sonhar . Mesmo sem licença dos novos donos da História, que se lambem de petróleo e ainda choram pelo nuclear, há quem acredite na Revolução, pelo menos enquanto não inventarem nenhuma ideia melhor do que as democracias parlamentares.

Eram, com efeito, os anos sessenta da era cristã. Os editores portugueses da altura esforçavam-se por andar à la page com a esquerda mais radicalizante da Europa, que o mesmo é dizer --falando de «intelligentzia» -- com os ditames de Paris.
Mais concretamente, o editor François Maspero dava o mote. Mais concretamente a sua «Petite Collection Maspero», com obras do tipo «coup de poing», tipo manifesto, tipo «evangelho programático» para os novos tempos. E se é certo que nenhum se atreveu, a traduzir em português «Les Chiens de Garde», do dito Paul Nizan, a verdade é que o «Aden Arabie», em tradução de Orlando Neves, agora relançado pela Estampa, cumpria a obrigação de revelar aqui um autor essencial ao processo então em curso.
É claro que a Esquerda militante e activista não dispensava padrinhos: e os editores só se aventuravam a revelar autores pouco ortodoxos e além disso terceiro-mundistas, com o beneplácito de um professor universitário, adornado de todo o prestígio, que pontificasse em Vincennes e atestasse que, por exemplo, Nizan ou, ainda pior, o Franz Fanon de «Os Condenados da Terra» não era totalmente analfabeto nem destituído de qualidades. Quer no caso de Nizan, quer no caso de Fanon, lá vinha, portanto, um prefácio do escritor Jean Paul Sartre, dando a necessária e devida benção ao franco-atiradorismo daqueles dois anticolonialistas e anti-imperialistas .
O curioso desta década prodigiosa é precisamente que a instituição universitária não só abonava os livros do livre-pensamento, como lhe dava chances de influenciar as novas gerações estudantis, que acabavam assim, muito higienicamente, muito profilacticamente, por contestar os mestres.
Em Maio de 1968, esses jovens estudantes proclamavam: «Nós Somos o Terceiro Mundo». Isto, quando não levavam as coisas ainda mais longe e gritavam: «Nós Somos o Vietname». Quando os professores de formação marxista que leccionavam em Paris se deram conta do fenómeno, era tarde: já tinham as barricadas à porta e o De Gaulle a pedir ajuda à Polícia para pôr cobro à insurreição da sebenta e da esferográfica -- a revolta estudantil.
Tudo isto tem a ver com as duas obras, altamente evocativas, -- «Aden-Arabie» e « O Direito à Preguiça» -- que voltam à banca das novidades dos últimos meses: há que saber porque voltam, a que vaga de fundo correspondem, se é possível desfraldar outra vez bandeiras que foram desfraldadas há três décadas, enfim, se depois de tantos traumatismos cranianos, as ideias irão influenciar a história e se em vez de negras marés de retrocesso, podemos registar, da facto, alguns progressos nesta nossa frente ocidental.
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