ZEN 1970
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CULTURA MORIBUNDA(*)
(*) Este texto de Afonso Cautela foi publicado no jornal «Notícias da Beira», Moçambique, em 11-8-1971.
15-06-1970 - [11-8-1971, in «Notícias da Beira»] - A hipertrofia analítica, a divisão das ciências e a especialização do trabalho não só intelectual mas manual, a própria separação entre intelectual e manual, criaram um caos nos costumes do homem ocidental a que ele não pode, com as raras operações e disciplinas de síntese, obviar.
Arte, filosofia, religião, desporto, são tudo actividades de síntese que não chegam a sintetizar coisa nenhuma. A última separação existe sempre, entre acção e pensamento, ainda quando o pensamento adrega de encontrar, rarissimamente ou nunca, o máximo estado de síntese; permanece o hiato, permanece o abismo entre prática e teoria, ideias e vida, cultura e existência, erudição e quotidiano.
É evidente que no caos meramente teórico nos ajuda alguma coisa ler Jung, ler Chardin, ou ler Toynbee, três filósofos da grande síntese, que até por isso chegam a ser acusados de místicos.
É evidente que, entre quotidiano e escola, o desporto pretende unificar e a religião, entre cultura e existência, pretende "religar"
Mas o Uno e o Múltiplo - o "grande problema", para Teilhard de Chardin - persiste: E o caos também.
Neste interim "dramático" - onde há dilaceramento, há drama - o Zen vem, monisticamente, romper a ruptura e o dualismo.
Para o Zen só existe experiência, o que significa uma diferença fundamental (vital, mesmo, para nós outros, os que sofremos com o divisionismo ocidental) em relação a toda a nossa cultura e seus pressupostos básicos.
Vejam-se as afinidades entre Zen e psicanálise que, por sua vez, desempenha a função primordial que se sabe na literatura e arte europeia, através do surrealismo.
Essas afinidades estão expostas num livro de que recentemente saiu a edição brasileira: Zen, Budismo e Psicanálise, ed. Cultrix,, São Paulo, 1970, com textos de D. T. Suzuki, Erich Fromm e Richard de Martino -, por aí, nas suas afinidades com a psicanálise, que o Zen encontra inúmeras e inusitadas afinidades, também, com o artista ocidental.
Depois, o artista terá de ser sempre iniciação e prova (Kierkegaard), conceito este que se opõe aos ciberneticistas ou pró-ciberneticistas mas que se aproxima, por exemplo, do que pensa Georges Bataille.
Aliás, o Zen como profunda experiência existencial, anda sempre ligado à actividade imaginativa, embora os teóricos do experimentalismo digam que não. São mesmo a mesma coisa. Imaginar é existir e poeta é o que ainda sabe existir num mundo ocidental que por completo se esquece e aliena disso: ao nosso homenzinho abjecto-objecto basta-lhe consumir.
E esta desistência de existir, este homem objecto, não se encontra apenas nas sociedades ditas capitalistas e do consumo do desperdício: encontra-se em todas onde a tecnologia transformou o homem num robot produtor-consumidor.
Em todas onde a revolução existencial está por fazer, ou porque se esqueceram de a fazer ou (o que é ainda mais grave) entendem que não é preciso fazer-se: é nisto - na revolução existencial - que o Zen presta valioso concurso aos homens de amanhã.
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(*) Este texto de Afonso Cautela foi publicado no jornal «Notícias da Beira», Moçambique, em 11-8-1971.
ULTRAPASSAR A HIPERTROFIA ANALÍTICA
DO PARADIGMA CIENTÍFICO:
O ZEN DÁ UMA AJUDA
DO PARADIGMA CIENTÍFICO:
O ZEN DÁ UMA AJUDA
CULTURA MORIBUNDA(*)
(*) Este texto de Afonso Cautela foi publicado no jornal «Notícias da Beira», Moçambique, em 11-8-1971.
15-06-1970 - [11-8-1971, in «Notícias da Beira»] - A hipertrofia analítica, a divisão das ciências e a especialização do trabalho não só intelectual mas manual, a própria separação entre intelectual e manual, criaram um caos nos costumes do homem ocidental a que ele não pode, com as raras operações e disciplinas de síntese, obviar.
Arte, filosofia, religião, desporto, são tudo actividades de síntese que não chegam a sintetizar coisa nenhuma. A última separação existe sempre, entre acção e pensamento, ainda quando o pensamento adrega de encontrar, rarissimamente ou nunca, o máximo estado de síntese; permanece o hiato, permanece o abismo entre prática e teoria, ideias e vida, cultura e existência, erudição e quotidiano.
É evidente que no caos meramente teórico nos ajuda alguma coisa ler Jung, ler Chardin, ou ler Toynbee, três filósofos da grande síntese, que até por isso chegam a ser acusados de místicos.
É evidente que, entre quotidiano e escola, o desporto pretende unificar e a religião, entre cultura e existência, pretende "religar"
Mas o Uno e o Múltiplo - o "grande problema", para Teilhard de Chardin - persiste: E o caos também.
Neste interim "dramático" - onde há dilaceramento, há drama - o Zen vem, monisticamente, romper a ruptura e o dualismo.
Para o Zen só existe experiência, o que significa uma diferença fundamental (vital, mesmo, para nós outros, os que sofremos com o divisionismo ocidental) em relação a toda a nossa cultura e seus pressupostos básicos.
Vejam-se as afinidades entre Zen e psicanálise que, por sua vez, desempenha a função primordial que se sabe na literatura e arte europeia, através do surrealismo.
Essas afinidades estão expostas num livro de que recentemente saiu a edição brasileira: Zen, Budismo e Psicanálise, ed. Cultrix,, São Paulo, 1970, com textos de D. T. Suzuki, Erich Fromm e Richard de Martino -, por aí, nas suas afinidades com a psicanálise, que o Zen encontra inúmeras e inusitadas afinidades, também, com o artista ocidental.
Depois, o artista terá de ser sempre iniciação e prova (Kierkegaard), conceito este que se opõe aos ciberneticistas ou pró-ciberneticistas mas que se aproxima, por exemplo, do que pensa Georges Bataille.
Aliás, o Zen como profunda experiência existencial, anda sempre ligado à actividade imaginativa, embora os teóricos do experimentalismo digam que não. São mesmo a mesma coisa. Imaginar é existir e poeta é o que ainda sabe existir num mundo ocidental que por completo se esquece e aliena disso: ao nosso homenzinho abjecto-objecto basta-lhe consumir.
E esta desistência de existir, este homem objecto, não se encontra apenas nas sociedades ditas capitalistas e do consumo do desperdício: encontra-se em todas onde a tecnologia transformou o homem num robot produtor-consumidor.
Em todas onde a revolução existencial está por fazer, ou porque se esqueceram de a fazer ou (o que é ainda mais grave) entendem que não é preciso fazer-se: é nisto - na revolução existencial - que o Zen presta valioso concurso aos homens de amanhã.
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(*) Este texto de Afonso Cautela foi publicado no jornal «Notícias da Beira», Moçambique, em 11-8-1971.
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