F. HERBERT 92
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1-2-1992
FILMES EM CASA - CRÓNICA DE VÍDEO POR TOMÉ DE BARROS - UMA ANTECIPAÇÃO AINDA COM INTERESSE - EXCESSO DE PESO NAS AREIAS DA DUNA
O êxito público do livro «Dune», de Frank Herbert, não se repetiu com o filme, realizado por um David Lynch que ainda não virara vedeta dos «media». Em parte porque o tema já não era novidade, em parte porque a «science fiction» em cinema tem muito má fama e nunca conseguiu livrar-se de um crónico complexo de mediocridade, em parte porque o filme acaba por não ter os rodriguinhos todos que o mercado considera necessários neste género, em parte porque a cenografia exterior apaga qualquer réstia de «vida interior» das personagens, «Dune» constituiu quase um fracasso.
No entanto, ao revê-lo em vídeo, algo permanece que o mostra sedutor: talvez a perspectiva de escala contribua para criar um certo fascínio ainda que os efeitos especiais, e a descomunal lagarta saiam pouco convincentes.
Esse vazio mental e emocional pode ser atribuído à época futura demasiado distante em que a história se situa: eventualmente, os sentimentos passaram há muito de moda, nesse remotíssimo ano 10.000, as emoções deixaram de existir, as novas gerações desconhecem reacções tão primárias dos primitivos humanóides, como (são o) o amor e o ódio.
Mas a contradição é óbvia e abre outro vazio na tessitura da intriga: se há relações entre mãe e filho, entre filho e pai, é porque nem todos, nesse ano da era intergaláctica, são produzidos em proveta. Isto pode significar que, nessa altura, a tecnologia não tomou ainda conta da alma humana de forma tão totalitária como os gulags modernos fazem prever, ou como alguns escritores mais críticos da «science-fiction» são os primeiros, hoje, a denunciar e a prenunciar.
Antes de o cinema o adaptar, «Dune» já era, como livro, titular de uma indústria. O best-seller inicial do primeiro volume confirmou-se e veio a série a exploração do sucesso: vários outros volumes se sucederam ao primeiro ( mais cinco títulos e dez milhões de exemplares vendidos), a história tornou-se interminável e até bandas desenhadas para colorir apareceram com os símbolos mais salientes desta história tecida -- mas mal cerzida -- de símbolos, talvez em número excessivo: o anel, a especiaria, o deserto, o messias, a arca, são apenas alguns desses sinais que remetem para significações abstractas e metafísicas. O livro, como se sabe, inclui um glossário com os 300 neologismos que a obra teria criado...O próprio título -- duna -- pretende garantir que se trata de um «épico ecológico», como lhe chama Eurico da Fonseca, no prefácio ao livro editado por Livros do Brasil e que ele traduziu.
Já o chamado «enredo» é tão confuso no filme como no livro: e não vou dizer que David Lynch, realizador de «Dune», adora tramas confusas, tão confusas como a série «Twin Peaks», mas o mistério, nele, é muitas vezes esse, a capacidade de complicar o que devia ser simples e transparente. A suposta existência de vários planetas não diversifica nem densifica a acção mas apenas a complica. O elenco de actores notáveis é atractivo, mas há um peso, que vem da própria cenografia de interiores, a tornar arrastado, monótono, sem chama e por vezes insignificante este conto do ano 10.000.
Outro exagero: para ficcionar o futuro, mas deixá-lo ainda verosímil, é necessário não avançar muitas décadas. Tudo o que vá muito para lá do ano 2050 arrisca-se a não ter sentido, porque se arrisca a não ter futuro... Levando em conta a aceleração que Alvin Toffler tanto enfatiza na sua tese da «terceira vaga», o planeta Terra estará muito em breve espatifado e é inconsequente, em face disto, avançar a sobrevivência em outros planetas.
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INTERFACES: O livro «Dune», de Frank Herbert, foi editado em três volumes por Livros do Brasil, a abrir a sua colecção «Colecção Argonauta Gigante -- Obras-primas da Ficção Científica» - A obra conta com uma introdução muito interessante do especialista Eurico da Fonseca.
Outros livros disponíveis de Frank Hebert, em tradução portuguesa: na Europa América, «O Efeito Lázaro», «O Incidente Jesus» (2 vol) e «A Praga Branca» (2 vol).
Na Distri, colecção de bolso, «A Barreira».
Com o título «Duna», é um dos três filmes de David Lynch registados no «Vídeo91», além de: «Calma Assassina» e «O Homem-Elefante». O «Guia» de Pedro Garcia Rosado, aliás, chama a atenção para os vários cortes que a película sofreu, por parte do produtor Dino de Laurentis, e para o facto de ser apenas o primeiro volume da obra o que vemos em cinema.
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1-2-1992
FILMES EM CASA - CRÓNICA DE VÍDEO POR TOMÉ DE BARROS - UMA ANTECIPAÇÃO AINDA COM INTERESSE - EXCESSO DE PESO NAS AREIAS DA DUNA
O êxito público do livro «Dune», de Frank Herbert, não se repetiu com o filme, realizado por um David Lynch que ainda não virara vedeta dos «media». Em parte porque o tema já não era novidade, em parte porque a «science fiction» em cinema tem muito má fama e nunca conseguiu livrar-se de um crónico complexo de mediocridade, em parte porque o filme acaba por não ter os rodriguinhos todos que o mercado considera necessários neste género, em parte porque a cenografia exterior apaga qualquer réstia de «vida interior» das personagens, «Dune» constituiu quase um fracasso.
No entanto, ao revê-lo em vídeo, algo permanece que o mostra sedutor: talvez a perspectiva de escala contribua para criar um certo fascínio ainda que os efeitos especiais, e a descomunal lagarta saiam pouco convincentes.
Esse vazio mental e emocional pode ser atribuído à época futura demasiado distante em que a história se situa: eventualmente, os sentimentos passaram há muito de moda, nesse remotíssimo ano 10.000, as emoções deixaram de existir, as novas gerações desconhecem reacções tão primárias dos primitivos humanóides, como (são o) o amor e o ódio.
Mas a contradição é óbvia e abre outro vazio na tessitura da intriga: se há relações entre mãe e filho, entre filho e pai, é porque nem todos, nesse ano da era intergaláctica, são produzidos em proveta. Isto pode significar que, nessa altura, a tecnologia não tomou ainda conta da alma humana de forma tão totalitária como os gulags modernos fazem prever, ou como alguns escritores mais críticos da «science-fiction» são os primeiros, hoje, a denunciar e a prenunciar.
Antes de o cinema o adaptar, «Dune» já era, como livro, titular de uma indústria. O best-seller inicial do primeiro volume confirmou-se e veio a série a exploração do sucesso: vários outros volumes se sucederam ao primeiro ( mais cinco títulos e dez milhões de exemplares vendidos), a história tornou-se interminável e até bandas desenhadas para colorir apareceram com os símbolos mais salientes desta história tecida -- mas mal cerzida -- de símbolos, talvez em número excessivo: o anel, a especiaria, o deserto, o messias, a arca, são apenas alguns desses sinais que remetem para significações abstractas e metafísicas. O livro, como se sabe, inclui um glossário com os 300 neologismos que a obra teria criado...O próprio título -- duna -- pretende garantir que se trata de um «épico ecológico», como lhe chama Eurico da Fonseca, no prefácio ao livro editado por Livros do Brasil e que ele traduziu.
Já o chamado «enredo» é tão confuso no filme como no livro: e não vou dizer que David Lynch, realizador de «Dune», adora tramas confusas, tão confusas como a série «Twin Peaks», mas o mistério, nele, é muitas vezes esse, a capacidade de complicar o que devia ser simples e transparente. A suposta existência de vários planetas não diversifica nem densifica a acção mas apenas a complica. O elenco de actores notáveis é atractivo, mas há um peso, que vem da própria cenografia de interiores, a tornar arrastado, monótono, sem chama e por vezes insignificante este conto do ano 10.000.
Outro exagero: para ficcionar o futuro, mas deixá-lo ainda verosímil, é necessário não avançar muitas décadas. Tudo o que vá muito para lá do ano 2050 arrisca-se a não ter sentido, porque se arrisca a não ter futuro... Levando em conta a aceleração que Alvin Toffler tanto enfatiza na sua tese da «terceira vaga», o planeta Terra estará muito em breve espatifado e é inconsequente, em face disto, avançar a sobrevivência em outros planetas.
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INTERFACES: O livro «Dune», de Frank Herbert, foi editado em três volumes por Livros do Brasil, a abrir a sua colecção «Colecção Argonauta Gigante -- Obras-primas da Ficção Científica» - A obra conta com uma introdução muito interessante do especialista Eurico da Fonseca.
Outros livros disponíveis de Frank Hebert, em tradução portuguesa: na Europa América, «O Efeito Lázaro», «O Incidente Jesus» (2 vol) e «A Praga Branca» (2 vol).
Na Distri, colecção de bolso, «A Barreira».
Com o título «Duna», é um dos três filmes de David Lynch registados no «Vídeo91», além de: «Calma Assassina» e «O Homem-Elefante». O «Guia» de Pedro Garcia Rosado, aliás, chama a atenção para os vários cortes que a película sofreu, por parte do produtor Dino de Laurentis, e para o facto de ser apenas o primeiro volume da obra o que vemos em cinema.
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