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Tuesday, August 01, 2006

MEDITERRÂNEO 1990

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1-8-1990

LEITURAS DE VERÃO - REGRESSO ÀS ORIGENS - O NOSSO PASSADO MEDITERRÂNICO (*)

No momento em que se assiste ao «crepúsculo» do Mediterrâneo, berço de civilizações e hoje apenas um «mar morto» por todas as poluições, é quase uma atitude nostálgica regressar às origens, à mescla de povos e civilizações que, desde os tempos mais remotos, desde os primeiros focos de germinação, na Ásia Menor e no Egipto até à unificação do mundo grego, se instalaram nas suas margens, se deixaram embebedar pela sua luz. Porque é sempre à luz que vamos dar, quando falamos do Mediterrâneo e seus deuses, seus mitos, seus poetas.
Ninguém melhor do que J. Gabriel-Leroux, um poeta disfarçado de historiador, para nos servir de cicerone nesta viagem encantada, onde praticamente nada do que é verdadeiramente importante para o destino dos povos mediterrânicos, fica esquecido: desde os «primeiros focos de civilização» no mar Egeu, passando pelo florescimento de Creta e o império de Minos,até à corrida por aquilo que o autor denomina «hegemonias marítimas» ( Fenícios, Etruscos, Helenos) e à eclosão do fenómeno» helénico, a singularidade da civilização mediterrânica emerge como um facto adquirido indiscutível. E é esse facto, essa personalidade colectiva, feita de mil fios entretecidos numa mesma teia de sedução, que o historiador torna sensível e de que traça o perfil extremamente preciso, rigoroso mas também emotivo.
Todos os que somos mediterrânicos e gostamos de nos banhar nas suas maravilhosas praias, de águas mornas e areias finas (?), temos neste livro de J. Gabriel-Leroux o nosso «retrato de família». Por algum motivo ele foi escolhido, em França, como manual dos estudantes franceses do ensino secundário. Leroux pertence àquela estirpe de investigadores que souberam transformar a história numa aliciante viagem de aventuras e paixão pelos caminhos do passado.
Como diz o autor, enfatizando especialmente os factores geográficos, « no sopé da Serra Nevada, dos Pirenéus, dos Alpes ou do Etna, ao longo do Tell africano, do Líbano ou do planalto anatólico, estende-se a mesma costa rochosa, acidentada, muitas vezes protegida por rosários de ilhas, cortada pelas mesmas torrentes caprichosas, quase secas no Verão.»
Prosseguindo a descrição, onde só falta ouvir o zumbido das cigarras, o historiador acrescenta: « Quase por todo o lado, entre a encosta e as alturas, domina uma zona prazenteira e fértil em que a vinha, a oliveira e a figueira se dão bem e em que a fina camada de terra vegetal impõe ao homem os mesmos processos de cultura, a mesma vida frugal e sadia, num clima temperado, sob um céu transparente, numa festa de cores e de luz.»
É assim que Gabriel Leroux disfarça a sensibilidade do poeta com os rigores do erudito. É assim, num estilo emotivo, que ele nos vai levar a todas as civilizações e povos deste mítico mar, quase nos deixando convencidos de que somos efetivamente civilizados. Tivemos, pelo menos, todas as condições para isso, como nos mostra e demonstra Leroux.
Para os que há muito se deixaram enfeitiçar pelo mito mediterrânico, a viagem proposta por Leroux apenas confirma as razões desse culto. Para os que pela primeira vez querem prestar homenagem à quase lendária (e em grande parte lendária) história de onde procedem, Leroux dá-lhes agora essa oportunidade única: nem todos os dias nos falam assim, com tanta admiração e fulgor, do melhor que tem uma civilização. Agora moribunda e, por isso mesmo, mais digna de pena.
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(*) «Primeiras Civilizações do Mediterrâneo», de J. Gabriel-Leroux, Ed. Teorema
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