RAMACHARACA: A VIDA DEPOIS DA MORTE
7-9-1999
DUAS TENDÊNCIAS NO HINDUÍSMO
GURUS E DEUSES
GURUS E DEUSES
Seja qual for o mérito deste texto inédito e das ideias sobre hinduísmo nele transcritas, ele teria sempre valido a pena pela metáfora que nos deixa em profunda cogitação: «Suponha uma fila de zeros: Ela será sempre zero por mais zeros que se coloquem à direita. Mas, de repente, coloca o algarismo 1 à esquerda e o número vale milhares ou milhões.»
De resto, o texto propõe uma observação crítica sobre o hinduísmo, reconhecendo nele pelo menos duas correntes muito diversas, o que raramente é feito, pois que regra geral se mete tudo no mesmo saco. A questão do acesso à origem dos textos e aos textos de origem recoloca-se com grande premência. Também no hinduísmo a questão das fontes se coloca. Um documentário sobre o Indo que ontem gravei em video cassete, mostra uma língua até hoje indecifrada: além destes hieróglifos, a civilização do Indo sugere outras pistas muito aliciantes na demanda das origens. Valeu a pena gravar e voltar, logo que possível, a saber um pouco mais do estranho e enigmático alfabeto. A metáfora proposta poderá continuar a acompanhar essa viagem à civilização perdida (?) do Indo. (4/Setembro/1999)
Os historiadores do hinduísmo assinalam a tendência intrínseca desta religião panteísta para a proliferação de seitas.
Mas que há diferenças, e diferenças profundas, nas diversas formas de interpretar os textos sagrados, as fontes sânscritas do hinduísmo, os próprios devotos não o negam.
Como me disse Ananta Deva Das, «os autores mais conhecidos no Ocidente, como Ramakrisna, Swami Vivekananda, Sri Aurobindo, Krishnamurti, Ramacharaca, Shivananda, pertencem todos à tendência por ele designada de «impersonalista» , em que - afirma Ananta Deva Das - « eles próprios se julgam Deus. Ora a nossa corrente, chamada personalista, distingue os dois planos, aceita a diferença entre o devoto e Deus.»
Eles, os impersonalistas - e ainda segundo o mesmo testemunho - cantam o mantra «Hare Krisna» pensando que vão tornar-se Krisna também, acreditam ser como o ferro que, em contacto com o fogo, se torna também incandescente...» suposição esta em que os chamados personalistas não acreditam.
Ananda explica melhor os meandros desta iniciação labiríntica: «Hare é um vocativo. Nós invocamos Deus para que ele nos ajude a elevar-nos espiritualmente.»
E a metáfora surge, límpida: «Suponha uma fila de zeros: Ela será sempre zero por mais zeros que se coloquem à direita. Mas, de repente, coloca o algarismo 1 à esquerda e o número vale milhares ou milhões.»
As figuras do hinduísmo «impersonalista» dariam, segundo os seus críticos, uma filosofia gratificante para as pessoas, convencendo-os assim: «Pratica este yoga e vais ser deus.»
A palavra «opulência» aparece nos textos desta comunidade num sentido diferente daquele que correntemente lhe damos:
«Havendo tantas coisas atractivas no mundo material - explica Ananta Deva Das - renunciar a elas é uma opulência.»
A renúncia ao desejo de explorar qualquer coisa em proveito próprio é uma constante no Darma e na prática hinduístas.
Constante também na doutrina emanada das fontes orientais é esta outra ideia:« Criar consciência de Krisna significa reviover ou reavivar o que está adormecido em nós.»
Gurdjieff definia assim todo o trabalho de iniciação espiritual: « Os homens dormem e nós viemos acordá-los...»
A propósito de renúncia, lemos num texto de Swami Prabhupada: « Quando nos tornamos senhores dos sentidos, ou gosvamis, podemos avançar na via espiritual. Swami significa que não somos servos dos sentidos mas sim senhores deles.
Note-se que esta fase já exigirá algo mais do que recitar o mantra. O brakta-yoga será a prática indicada a quem queira evoluir para estádios mais avançados de interminável iniciação.
Em qualquer caso, inserem-se neste domínio dos sentidos, as normas aparentemente espartanas , os 4 princípios reguladores ou restrições : não comer nunca carne, nem peixe, nem ovos; não jogar jogos de fortuna ou azar; não praticar qualquer tipo de tóxico ou intoxicante ; não praticar sexo «ilícito».
O convite à castidade entende-se melhor como fase preparatória para a etapa complicada , difícil e mais evoluída, designada «tântrica», canalização ou administração da energia sexual conforme se entende de acordo com o Dharma.